Latin American Art: Artists and artworks we should know
RIZOLLI, Marcos; SILVEIRA, Isabel Orestes. Arte Latino-Americana: Artistas e obras de arte que devemos conhecer. In: Aguarrás, vol. 8, n. 38. ISSN 1980-7767. São Paulo: Uva Limão, JUL/DEZ 2021. Disponível em: <http://aguarras.com.br/arte-latino-americana/>. Acesso em: [current_date format=d/m/Y].
Resumo
Compreendendo um amplo arco espaço-temporal, este estudo pretende configurar um agudo panorama artístico e cultural dedicado aos artistas latino-americanos, revelando – de suas trajetórias criativas – as suas potentes criações, traduzidas em obras de arte. Ao apresentar os artistas e revelar suas concepções, ideias e pensamentos sobre arte, pretende-se, também, oferecer instrumentos – técnicos e intelectuais – para a visualização e análise crítica do fenômeno artístico latino-americano – tão singular, quanto universal.
Palavras-chave: América Latina. Cultura Visual. Arte. Artistas. Cartografia.
Abstract
Understanding a wide time space arc, this study intends to configure an acute artistic and cultural panorama dedicated to Latin American artists, revealing – from their creative trajectories – their potent creations, translated into works of art. When presenting artists and revealing their conceptions, ideas and thoughts about art, it is also intended to offer instruments – technical and intellectual – for the visualization and critical analysis of the Latin American artistic phenomenon – as unique as universal.
Key words: Latin America, Visual Culture, Art, Artists. Cartography.
Introdução
Muito pode ser dito sobre a América Latina, seja pelo olhar histórico tradicional que aponta para influências europeia e norte-americana; quer seja pela herança colonial e os determinantes sociais decorrentes do período, os quais denunciam até hoje, a realidade social, política ou cultural, de muitos países e os aspectos que os distinguem. Dada a amplitude de tais temas, este artigo objetiva desvelar o universo de alguns artistas latino-americanos na tentativa de promover um diálogo sobre obras que revelam a diversidade das culturas das Américas do Sul e Central, as quais atualizam nossa identidade no mundo contemporâneo.
De um ponto de vista eurocêntrico a Arte Latino-americana tem sido historicamente considerada um fenômeno periférico. Contudo, nas contemporâneas conexões entre o local e o global, entre o centro e as bordas – abrem-se novas fronteiras de linguagem e expressão para seus artistas. As américas, do Sul, Central e parte do Norte – baseadas culturalmente em suas raízes coloniais – Espanha, Portugal e África – e em sua dinâmica migratória, revelam-se celeiros criativos para artistas, que ao tempo que revelam suas culturas, dialogam com a universalidade da arte. E, assim, devemos conhecê-los. Bem como, suas obras de arte mais significativas. Tudo panoramicamente, para compreendermos nosso próprio território simbólico.
São muitas as pesquisas e publicações sobre a História da Arte e sobre diferentes artistas da América Latina. Dada a grande quantidade de assuntos, alguns recortes temporais têm sido frequentes como o estudo de Dawn Ades (1997) que compreende o período de 1820 a 1980. Outros teóricos destacam o Movimento Modernista Brasileiro (SCHWARTZ, 1995; TELES, 1983; TOLIPAN, 1983) para citar alguns que destacaram o ano de 1922, com a chamada Semana de Arte Moderna, realizada nos dias 15, 17 e 19 de fevereiro em São Paulo, Brasil, e que se tornou referência no pensamento latino-americano. Outras investigações apontam a miscigenação entre os povos indígenas/nativos locais, com portugueses, espanhóis, africanos e, posteriormente os ingleses, alemães, italianos, dentre tantos que faz surgir, nas Américas, um povo plural com inúmeras e diversificadas linguagens e culturas (PINHEIRO, 2009/2013 – GRUZINSKI, 2001 – SARDUY,1979).
A preocupação com o artista e obra e a gama alargada da linguagem e produção artística vinculada com a cultura latino-americana vem sendo de igual modo investigada. Cita-se Ajzenberg (2019) e Rizolli (2010). Assim, as linguagens artísticas se tornaram alvo de investigação em meios acadêmicos e muitas coletâneas vão surgindo, como por exemplo os teóricos que abordam as artes pré-colombiana e ameríndia, africana e japonesa e ampliam os debates sobre tais estudos na atualidade (AVOESE e MENESES, 2020). Silveira e Brito (2021) de igual modo reúnem pesquisadores que reverberam a polifonia de vozes destacando pesquisas de estudantes, de críticos de arte, de gestores de centros culturais, educadores, jornalistas e tantos outros que contribuem para a expansão do campo de tais estudos na atualidade.
Por isso, a intenção mais modesta da abordagem que se faz neste estudo será utilizar o método da cartografia para mapear, dentre um panteão de artistas, alguns cujas obras destacam estilos, lugares, estética e nos dão a conhecer a dimensão da linguagem expressiva da arte latino-americana. Ao optar pela cartografia como metodologia, acalenta-se vislumbrar territórios que promovam percursos variados os quais comportam desvios temporais e históricos, sem necessariamente preocupar-se em detalhar a caminhada. Espera-se pelo sobrevoo da investigação inclinar os olhos sensíveis do conhecimento em direção as obras de arte e permitir-se durante a jornada deixar-se ser seduzido pela paisagem.
Assim, compreendendo um amplo arco espaço-temporal do agudo panorama artístico e cultural dedicado aos artistas latino-americanos, propõe-se revelar – suas trajetórias criativas – as suas potentes criações, traduzidas em obras de arte.
A América Latina
Destaca-se a região do continente americano que engloba os países onde são faladas, primordialmente, línguas românicas (derivadas do latim) espanhol, português e francês – visto que, historicamente, a região foi dominada pelos impérios coloniais europeus Espanhol e Português.
A América Latina tem uma área equivalente a cerca de 3,9% da superfície da Terra. Nos dias de hoje, sua população está estimada em mais de 600 milhões de pessoas
A América Latina compreende a quase totalidade das Américas do Sul e Central: as exceções são os países sul-americanos da Guiana e do Suriname e a nação centro-americana de Belize e da Jamaica, que são países de línguas germânicas. Também engloba alguns países da América Central Insular (países compostos de ilhas e arquipélagos banhados pelo Mar do Caribe), como Cuba, Haiti e República Dominicana. Da América do Norte, apenas o México é considerado como parte da América Latina.
A região engloba 20 países: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Equador, El Salvador, Guatemala, Haiti, Honduras, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana, Uruguai e Venezuela.
A expressão América Latina foi utilizada pela primeira vez em 1856 pelo filósofo chileno Francisco Bilbao e, no mesmo ano, pelo escritor colombiano José María Torres Caicedo; e aproveitada pelo imperador francês Napoleão III durante sua invasão francesa no México como forma de incluir a França — e excluir os anglo-saxões — entre os países com influência na América. Na mesma época foi criado o conceito de Europa Latina, que englobaria as regiões de predomínio de línguas românicas.
Pesquisas sobre a origem da expressão conduzem, ainda, a Michel Chevalier, que mencionou o termo América Latina em 1836, durante uma missão diplomática feita aos Estados Unidos e ao México. Nos Estados Unidos, o termo não foi usado até o final do século XIX tornando-se comum para designar a região ao sul daquele país já no início do século XX.
Ao final da Segunda Guerra Mundial, a criação da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe consolidou o uso da expressão como sinônimo dos países menos desenvolvidos dos continentes americanos, e tem, em consequência, um significado mais próximo da economia e dos assuntos sociais.
A Organização das Nações Unidas reconhece a existência de dois continentes: América do Sul e América do Norte, sendo que esta última se subdivide em Caribe, América Central e América do Norte propriamente dita, englobando México, Estados Unidos e Canadá, além das ilhas de Saint Pierre et Miquelon, Bermudas e a Groenlândia.
As antigas colônias neerlandesas (e, atualmente, países constituintes do Reino dos Países Baixos) Curaçao, Aruba e São Martinho não são habitualmente consideradas partes da América Latina, embora sua língua mais falada seja o papiamento, língua de influência ibérica (embora não considerada latina).
Ou seja, a identidade Latino-Americana vai além de suas realidades geográficas, econômicas, políticas ou sociais – é um fenômeno de dimensão cultural. E, historicamente, artistas tem contribuído para a sua afirmação expressiva. Em nossa eletiva cartografia, trataremos de identificar alguns significativos artistas que, além de definirem as artisticidades de seus países, contribuíram ou contribuem dialeticamente para a configuração da diversificada identidade cultural latino-americana.
O Cone Sul
Chile: Lotty Rosenfeld – Foi uma artista interdisciplinar que viveu e trabalhou em Santiago (1943 – 2020). Sua entrada no circuito artístico chileno se deu no final dos anos 1970.
Rosenfeld realizou intervenções artísticas em áreas urbanas, muitas vezes manipulando sinais de trânsito, a fim de desafiar os espectadores a repensarem as noções de espaço público e agência política. Seu trabalho foi exibido em várias cidades da América Latina e Europa, no Japão e Austrália.
O envolvimento de Rosenfeld na arte aconteceu durante o período do Golpe Militar do Chile. Sob esse regime, fez uso da arte para demonstrar como o poder oficial e as zonas de conflito submetem os corpos às margens e às fronteiras. Ela abdicou dos espaços consagrados de arte e seu mercado e usou as ruas para realizar seu trabalho, em última análise, interrogando espaços políticos e culturais. Com sua arte, ela esperava poder mudar a mentalidade das pessoas alterando a história de seu país.
O meio inicial com que trabalhou foi a arte do vídeo. Rosenfeld, então, se associou com a Escena de Avanzada, um movimento de artistas e escritores que apareceram no cenário artístico chileno depois do golpe de Estado de 1973.
Em 1979 conheceu alguns poetas e romancistas, entre eles Diamela Eltit e Raúl Zurita. Juntos, formaram o CADA – Colectivo de Ações de Arte, que se tornou um grupo de artistas ativistas que realizou intervenções e performances para desafiar o regime de Pinochet durante os anos 1970 e 1980. Ela também esteve envolvida com o legendário Fluxus, um grupo experimental e interdisciplinar internacional relacionado a artes visuais, música e literatura.
Rosenfeld é mais conhecida por sua ação de arte intitulada Una milha de cruces sobre o pavimento, de 1979.
Com a ajuda de pessoas anônimas, a artista transformou as linhas pintadas que dividem as ruas em cruzes com um eixo perpendicular feito de fita branca. Usou linhas retas no pavimento como uma metáfora do firme controle do regime de Pinochet. Ao alterar essas marcações transgrediu o sistema de controle e confrontou o público com uma inesperada subversão de significado. Ela converteu um sinal de subtração (-) em um sinal de adição (+), desafiando a ideia de que os sinais devam ter significados fixos. A intervenção interrompeu o tráfego diário da via pública.
O trabalho de Rosenfeld tratou da transformação e intervenção do espaço urbano público com o uso do simbolismos para questionar o status político e de autoridade. Influências da realidade que enquadram as rotinas das sociedades tornaram-se os alicerces físicos de suas intervenções criativas.
Argentina: Marta Minujín – Nascida em Buenos Aires, em 1943, no boêmio bairro de San Telmo, tem se destacado como uma das principais artistas conceituais e da performance na América Latina.
Uma de suas obras mais conhecidas, Parthenon de Libros (1983), uma reprodução do Parthenon de Atenas construída com livros foi também apresentada na Documenta de Kassel, Alemanha, em 2017. A instalação é a materialização das suas preocupações e interrogações sobre as possibilidades da linguagem artística e sua capacidade de afetar e transformar o espectador.
Estudante no Instituto Nacional de Arte Universitária, exibiu pela primeira vez seu trabalho em festival de arte no Teatro Agónm, em 1959. Uma bolsa da Fundação Nacional das Artes permitiu que ela viajasse para Paris como um dos jovens artistas argentinos apresentados em Trinta Argentinos da Nova Geração, uma exposição de 1960 organizada pelo juiz da Bienal de Paris.
Ela ganhou o Prêmio Nacional em 1964 no Instituto Torcuato di Tella de Buenos Aires, onde preparou dois eventos: Eróticos en technicolor e Revuélquese y viva interativo.
Também em 1964, sua Cabalgata (Cavalgada) foi ao ar na televisão pública naquele ano, e envolveu cavalos com baldes de tinta amarrados às suas caudas. O impacto de Cabalgata a levou para Montevidéu, onde organizou Sucesos, no Estádio Tróccoli da capital uruguaia, com 500 galinhas, artistas de formas físicas contrastantes, motocicletas e outros elementos.
Comprando um carregamento de milho, Minujín dramatizou a dívida externa argentina com uma série de fotos de 1985, na qual ela simbolicamente entregou o milho ao legendário artista Pop Andy Warhol, em pagamento pela dívida. Eles nunca mais se encontraram, pois Warhol faleceu dois anos depois.
Uruguai: Torres García – Nasceu, viveu e morreu na sua querida Montevidéu (1874 – 1949). Foi um importante e influente pintor, desenhista, escultor e professor uruguaio. Conquistou renome internacional.
Na juventude viajou para a Europa e fixou-se em La Llodja, na Catalunha e estudou na Escola de Belas Artes local. Logo em seguida transferiu-se para Barcelona, para frequentar a Academia Baixa e o círculo artístico de Sant Lluc, grupo fortemente influência pelo classicismo grego. No mesmo período trabalhou com o renomado arquiteto catalão Antoni Gaudí nos vitrais da Catedral de Palmas de Mallorca e na obra da Catedral Sagrada Família de Barcelona.
Posteriormente, viveu em Nova Iorque, onde fabricava brinquedos de madeira como meio de sustento familiar, tal experiência influenciou em sua obra pictórica na sintetização das formas. Também viveu em Paris, travando decisivo contato com os pais do Neoplasticismo: Theo van Doesburg e Piet Mondrian.
No entanto o estilo proposto por Torres García fugia da rigidez abstrata formalista, e buscou fontes mais primárias como a Arte Africana, a Arte pré-colombiana, a arte Aborígene australiana, entre outras.
Nos anos 30, retorna a Montevidéu e abastecido de diversas informações funda um estilo próprio de arte, conhecido como: Universalismo Construtivo. Este movimento foi muito conhecido em seu país e em alguns países vizinhos.
Torres García foi o artista sul-americano com maior contato europeu de vanguarda no Século XX, conhecendo personalidades como: Joan Miró, Theo van Doesburg, Jean Arp, Wassily Kandinsky, Fernand Léger, Antoni Gaudí, Le Corbusier, Piet Mondrian e, nos Estados Unidos, Joseph Stella.
Dada a sua importância e influência, logo após a sua morte, em 1949, foi fundado o Museu Torres García – com sede em Montevidéu – para reunir, preservar e difundir a sua obra.
Brasil: Beatriz Milhazes – Pintora, gravadora e ilustradora, nasceu no Rio de Janeiro, em 1960. Sua obra se caracteriza pelo uso da ornamentação, constituída, sobretudo, por arabescos e motivos ornamentais.
Milhazes graduou-se em 1981 em Comunicação Social e, em paralelo, realizou sua formação artística na Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no período de 1980 a 1983. Dedica-se à pintura, gravura e ilustração. Suas obras da década de 1980 revelam uma tensão entre figura e fundo, entre representação e ornamentalismo.
Posteriormente, faz opção por uma pintura de caráter decididamente bidimensional. De 1995 a 1996, estuda gravura em metal e linóleo no Atelier 78. Atua, ainda, como professora de pintura até 1996 no Parque Lage.
A artista, de o início de sua carreira, revelou sensibilidade no uso da cor. Participou das exposições que caracterizaram a Geração 80 – grupo de artistas que retomaou a pintura em contraposição à vertente conceitual dos anos de 1970, e se caracterizou pela pesquisa de novas técnicas e materiais.
Sua obra faz referências ao Barroco, à obra de Tarsila do Amaral (1886-1973) e Burle Marx (1909-1994) e aos padrões ornamentais da Art Déco.
Sempre enfrentou a pintura como fato decorativo, aproximando-se da obra de artistas como Henri Matisse (1869-1954). Interessa-se pela profusão da ornamentação barroca, sobretudo pelo ritmo dos arabescos e pelos motivos ornamentais presentes na obra de Guignard (1896-1962).
Desde os anos 1990, a artista vem se destacando em mostras internacionais nos Estados Unidos e na Europa e integra acervos de museus como o MoMA, Guggenheim e MET, em Nova Iorque, do Museo Reina Sofia, em Madri, entre outros.
Milhazes trabalha frequentemente com formas circulares, sugerindo deslocamentos ora concêntricos ora expansivos. Na maioria dos trabalhos, prepara imagens sobre plástico transparente, que são descoladas, como películas, e aplicadas na tela por decalque. Aglomera as imagens, preenchendo o fundo e retocando a imagem final. Os motivos e as cores são transportados para a tela por meio de sucessivas colagens, realizadas com precisão.
A transferência das imagens da superfície lisa para a tela faz com que a gestualidade seja quase anulada. A matéria pictórica obtida por numerosas sobreposições não apresenta, entretanto, nenhuma espessura: os motivos de ornamentação e arabescos são colocados em primeiro plano. O olhar do espectador é levado a percorrer todas as imagens, acompanhando a exuberância gráfica e cromática presente em seus quadros.
Paraguai: Ramón Cáceres – Pintor, escultor, restaurador e cantor. Atualmente assina Cáceres, assinava Ramonchi (até 1984). Ramón Cáceres nasceu em 1944, em Quiindy, Paraguai.
Depois de estudar pintura e música na Escola de Belas Artes da Universidade Nacional do Paraguai, em Assunção, emigrou para o Brasil, em 1970, fixando residência em São Paulo, onde desenvolveu sua carreira artística. Ramón participou de numerosas exposições coletivas no Brasil e no exterior, e realizou sete exposições individuais no Brasil, uma delas no MASP – Museu de Arte de São Paulo, sendo apresentado por seu então diretor P. M. Bardi.
Paralelamente desenvolveu carreira como restaurador e como cantor, transformando-se, na expressão do maestro Hermínio Gimenez, num dos mais altos expoentes, como intérprete, da bela música paraguaia.
Inicialmente figurativa, a pintura de Ramón Cáceres tendeu para a abstração geométrica. Sua pintura construtiva remete com frequência a bandeiras.
No prefácio do catálogo de sua última mostra individual, ocorrida em 2007 no Espaço Cultural do BNP PARIBAS, em São Paulo, o crítico de arte Enock Sacramento afirmou que, dentre os artistas originários do construtivismo como um todo e do concretismo em particular, no Brasil, Ramón Cáceres ocupa um lugar especial por sua sensibilidade refinada e por sua notável qualidade de harmonizar formas, cores e ritmos na composição.
Restaurador de obras de arte Ramón Cáceres é uma figura bem conhecida nos ambientes artísticos brasileiros, porém, além de sua atividade como restaurador, ele exerce a profissão de pintor livre e criativo.
O Traço Andino
Bolívia: Roberto Mamani Mamani – Nascido em 1962 em território indígena, próximo de Cochabamba, de onde seus pais mudaram-se por não terem o casamento reconhecido na comunidade, Mamani teve formação autodidata e começou a pintar com as cinzas do fogão. Foi o único filho da família que conseguiu estudar – fez agronomia em La Paz, mas logo passou a pintar sistematicamente: penetrando na escuridão da miséria, sendo parte dela, nas suas palavras.
Realizou várias exposições no exterior e recebeu seu primeiro prêmio em 1991, representando as imagens e os sentimentos da cultura indígena boliviana com um tom emocional consonante à vida andina e suas cores vibrantes.
As pinturas do artista boliviano irradiam as combinações de vermelho, turquesa, violeta e laranja, características da região. Segundo Evo Morales: a força das cores nas obras de Mamani refletem o autêntico espírito combativo das nações originárias indígenas do povo boliviano. Seu trabalho é significativo no uso da tradição e símbolos dos indígenas.
Sua arte foi exibida em todo o mundo, incluindo mostras em Washington-DC, Tóquio, Munique, China, Cingapura e Londres.
As pinturas de Mamani se valem de sua herança cultural e incluem imagens estilizadas de mães, animais, sóis e luas indígenas, entre outros temas. O artista usa cores fortes e vibrantes, semelhantes às cores dos tecidos tradicionais feitos à mão, amplamente utilizados pelos povos indígenas do Altiplano boliviano.
Seu uso de símbolos indígenas é especialmente significativo no contexto sul-americano, onde as culturas indígenas são vistas como inferiores à cultura europeia.
Peru: Fernando de Szyszlo – (Lima, 1925 – 2017) foi um pintor, escultor, gravador e professor peruano, uma figura-chave no avanço da arte abstrata na América Latina desde meados da década de 1950 e um dos principais artistas plásticos da Peru.
Autor do que já foi definido como cubismo inca, Szyszlo estudou arquitetura na Escola Nacional de Engenharia e na Faculdade de Artes Plásticas da Universidade Católica de Lima. Nesta última teve como mestre o pintor expressionista austríaco Adolfo Winternitz.
Artista culto, marcou sua obra tanto pelas influências pictóricas – Klee, Miró, Matisse, Vermeer, De Chirico e Picasso – quanto literárias – Valdelomar, Westphalen, José María Arguedas, Julio Cortázar e Mario Vargas Llosa.
Sempre orientado pelo espírito vanguardista, aos 24 anos viajou para a Europa, onde estudou as obras de Rembrandt e Tintoretto e absorveu várias influências modernistas. Em Paris, frequentou o grupo de escritores e intelectuais que se encontravam regularmente no Café de Flore. Ali começou a orientar seu caminho para a participação no movimento internacional da arte moderna, preservando as raízes da cultura latino-americana. Ficaram famosas as reuniões em seu apartamento parisiense, nas quais Breton, Lacan e Octavio Paz dançavam boleros enquanto o pintor mexicano Rufino Tamayo tocava violão.
Entre 1950 e 1955, de volta ao Peru, tornou-se um dos principais defensores do Abstracionismo e passou a expor em várias cidades da América Latina e dos Estados Unidos.
Sua obra voltou-se cada vez mais para as influências das formas pré-coloniais (com títulos na língua quíchua), o que marcou a originalidade de suas formas, combinando as vanguardas europeias com alusões aos deuses nativos, a Machu Picchu.
Em 1958, assumiu o cargo de professor titular de pintura na Universidade Católica de Lima. Foi, ainda, professor visitante na University of Cornell (1962) e conferencista visitante da University of Yale (1966).
Nos anos 60, compôs séries famosas como Apu Inca (1963) e Paisaje (1969).
Entre as décadas de 1970 e 1980, elaborou novas séries pictóricas dentro de uma tendência expressionista e abstrata de forte cromatismo, refletindo sua contínua experimentação com os espaços abertos, nos quais joga com a luz, os reflexos e a profundidade.
Participou da XXIX Bienal de Veneza, em 1958, da Bienal de São Paulo nas edições de 1957 (Menção Honrosa), 1959, 1961 e 1975 (Sala Especial, com pinturas e gravuras). Em 1981, compôs um mural para a sede da OEA.
Em 2001, foi publicado o livro Szyszlo. Travesía , de Mariella Balbi, uma longa entrevista que passa em revista a vida do artista.
Em 2005, recebeu a Gran Cruz da Orden José Gregorio Paz Soldán, enquanto era presidente da Comissão Consultiva de Cultura do Ministério das Relações Exteriores do Peru. Em outubro do mesmo ano, a Galeria Kreisler, de Madri, inaugurou a primeira grande exposição individual do artista na Espanha.
Szyszlo viveu em Lima, Peru, até a sua morte.
Equador: Oswaldo Guayasamín – Nasceu e morreu em Quito, Equador (1919 – 1999). Pintor, muralista e escultor, o equatoriano universal cuja obra transcende todas as fronteiras, nas palavras de Pablo Neruda, era filho de um índio e de uma mestiça.
Estudou na Escola de Belas Artes de Quito entre 1932 e 1940. Sua primeira exposição individual foi realizada em 1942.
Nos anos 1940, teve diversas obras compradas pelo magnata de mecenas das artes Nelson Rockefeller, o que o levou aos Estados Unidos, onde expôs, em 1943, no Museum of Art (Três pintores sulamericanos em São Francisco) e no City Art Museum, Saint Louis (Artistas sulamericanos), com Susana Guevara, Enrique G. Brent e Candido Portinari. Ainda nesse ano, no México, estudou com José Clemente Orozco (1883-1949) a pintura em Afresco.
Entre 1944 e 1945, Guayasamín viajou pela América do Sul, visitando Peru, Bolívia, Argentina, Uruguai e Brasil. Além de expor nesses países, compôs uma série de quadros impactantes chamados Huacayñán, o caminho das lágrimas em língua quíchua, que foram apresentados no Museu de Arte Colonial, em Quito, em 1951, e no Museu de Belas Artes de Caracas, em 1952 (e depois em diversas cidades do mundo).
Em 1948, criou seu primeiro Afresco, para a Casa de Cultura do Equador. Em 1956, recebeu o Grande Prêmio da III Bienal Hispano-Americana de Arte, em Barcelona, e no ano seguinte o Grande Prêmio de Pintura na IV Bienal de São Paulo (que voltou a exibir suas telas na XX edição). Nos anos 1950, expôs diversas vezes nos Estados Unidos, na Europa e em vários países da América Latina.
Em 1960, recebeu uma sala de honra na II Bienal Interamericana de Pintura, Escultura e Gravura do México, onde também foi premiado.
Nos anos 1960, criou uma série de 250 telas denominadas La edad de la ira, que foram exibidas em 1966 em Roma (1966), e México-DC (1968) e em Santiago (1969) – antes de seguir pelo resto do mundo.
Em 1974, Guayasamín recebeu o título de Officier de L’Ordre des Arts et des Lettres do governo da França, que lhe concedeu também a Legião de Honra, em 1984. Nos anos 1970, várias retrospectivas de sua obra tiveram lugar em São Francisco (1974), Medellín (1976), Quito (1977), São Petersburgo e Havana (ambas em 1982). Em 1994, recebeu medalha da Unesco pela Defesa dos Direitos Humanos.
Deixou diversos murais em várias cidades, como Quito, Madri, Paris e São Paulo (no Memorial da América Latina).
Colômbia: Doris Salcedo – Nascida em Bogotá em 1958, talvez, seja a artista contemporânea colombiana de maior reconhecimento internacional. Ela vive e trabalha em sua cidade natal.
Após concluir o bacharelado em Belas Artes na Universidade de Bogotá, em 1980, viajou para Nova Iorque, onde concluiu seu mestrado na Universidade local. Em seguida, retornou a Bogotá e tornou-se professora na Universidade Nacional da Colômbia.
Em suas instalações são frequentes os objetos cotidianos, como móveis de madeira e peças de vestuário. Sua obra parte da memória da violência política. Dá forma à dor, ao trauma e à perda, criando um espaço para o luto individual e coletivo.
Assim, declara: Centrei toda minha obra na violência política. No início de cada trabalho há um testemunho. Então todas as obras, todas as instalações que faço estão relacionadas a isso. Parto sempre de um testemunho real e em cima disso vou construindo algo que já não é tão precisamente sobre essa vítima, mas que leva a uma memória que é algo um pouco mais amplo sobre esse tipo de eventos.
A obra de Doris lida com o vazio insuportável deixado pelo desaparecimento. Nela, a presença de objetos frequentemente representa ausências, como no caso de noviembre 6 y 7 (2002), em que cada umas das 280 cadeiras vazias que desciam lentamente a fachada do Palácio de Justiça (a Suprema Corte Colombiana) representava a ausência de alguém que a teria ocupado antes da chacina que resultou da violenta tomada do prédio pelos guerrilheiros do M-19 e da reação do exército e da polícia ao ato.
Doris Salcedo foi a oitava artista convidada a ocupar a Turbine Hall da Tate Modern, em Londres. Nela, apresentou instalação Shibboleth (2007), uma rachadura de 167 metros de extensão no piso da galeria. Para Salcedo, essa rachadura representa fronteiras, a experiência dos imigrantes, da segregação, do ódio racial. É a experiência de uma pessoa do terceiro mundo, vindo para o coração da Europa.
Doris Salcedo aborda o esquecimento e a memória em suas instalações. A artista transforma itens corriqueiros, como cadeira e mesa, em memoriais para as vítimas da guerra civil na Colômbia. Em suas instalações, apresenta objetos aparentemente banais que, de perto, capturam a imaginação do espectador com materialidades inesperadas e assombrosas.
Outra obra importante, Istambul (2003) é uma instalação composta de 1.550 cadeiras empilhadas entre dois altos prédios urbanos. A ideia com esta peça foi criar uma topografia de guerra. Para Salcedo, ela se destina a representar a guerra em geral, e não um evento histórico específico. Ao acumular essas 1.550 cadeiras de madeira amontoadas entre os dois prédios no centro de Istambul, a artista evoca as vítimas anônimas.
Pensa tanto em caos quanto em ausência, dois efeitos de violência do tempo de guerra. Salcedo explica: o que tento extrair dessas peças é aquele elemento que é comum em todos nós. E, em uma situação de guerra, todos nós passamos por isso da mesma maneira, seja como vítima ou agressor. Então, eu não estou narrando uma história em particular. Eu estou apenas me dirigindo a experiências.
O Círculo Caribenho
Venezuela: Gego – Gertrud Louise Goldschmidt (1912 – 1994), conhecida como Gego, foi uma artista visual venezuelana (contudo, nascida na Alemanha).
Gego é, talvez, mais conhecida por suas esculturas geométricas e cinéticas feitas nas décadas de 1960 e 1970, que ela descreveu como desenhos sem papel.
Embora fosse sobrinha do historiador de arte medieval Adolf Goldschmidt, que lecionou na Universidade de Berlim, ela decidiu frequentar a Technische Hochschule de Stuttgart em 1932. Em 1938, ela diplomou-se em Arquitetura e Engenharia.
Como sua família era judia, a vida se tornou muito difícil quando os nazistas ganharam o poder em 1934. Sua cidadania alemã foi anulada em 1935. Forçada a deixar a Alemanha, sua família se mudou para a Venezuela em 1939 e Gego ganhou a cidadania venezuelana em 1952.
Depois de se mudar para Caracas, ela ensinou na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Central da Venezuela entre 1958 e 1967. Além disso, entre 1964 e 1977, ela ensinou no Instituto Neumann de Design. Ela ensinou Forma bidimensional e tridimensional e Soluções espaciais.
Chegando na Venezuela durante um boom econômico, Gego se viu cercada por artistas que desfrutavam de muito sucesso. O modernismo foi a moda artística que varreu a América Latina e os artistas na venezuelanos participaram com entusiasmo. O modernismo também era uma ferramenta política!
Os governos latino-americanos estavam tentando acompanhar os avanços dos Estados Unidos durante a era pós-Segunda Guerra Mundial e a Venezuela pensava que, ao incentivar o movimento de arte moderna, incorporaria ideias da indústria, ciência e arquitetura – num sentimento progressista.
Gego fez sua primeira escultura em 1957.
Ela conhecia o movimento moderno quando chegou a Caracas, mas não queria simplesmente copiar as ideias da Arte Cinética, Construtivismo ou Abstração Geométrica. Em vez disso, queria criar um estilo próprio, ao usar aspectos de sua vida em sua arte – por exemplo, sua herança alemã.
No final, Gego viu que esses novos projetos rotulados do movimento desenvolvimentista estavam agradando a elite e ao governo, mas ela queria uma arte que se relacionasse com a sociedade venezuelana. Na Arte Cinética, incorporou as ideias de movimento, bem como a importância da experimentação e do espectador.
Somente em meados da década de 1960, a artista se afastou do conceito básico de Arte Cinética para elaborar instigantes ideias sobre a linha. Para ela, uma linha habitava seu próprio espaço e, como tal, não era um componente em um trabalho maior, mas, ao contrário, era um trabalho por si só. Portanto, em suas obras de arte, ela não usava linha para representar uma imagem: linha é a imagem.
A força ou o objetivo da linha foi aprimorada pelo uso de diferentes materiais, como aço, arame, chumbo, nylon e vários metais. Gego não apenas usou esses materiais para criar linhas em suas esculturas maciças, mas também em sua série intitulada Desenhos sem papel. Esses pequenos trabalhos foram criados a partir de pedaços de metal que foram dobrados para evocar movimento, experimentação e espontaneidade.
Seus Desenhos sem Papel refletem uma original visão do espaço.
Gego considerava o espaço como sua própria forma; como se a obra de arte estivesse ocupando o próprio ambiente. Como seu trabalho é feito de redes e materiais semelhantes a grades, o espaço negativo está em toda parte, fazendo com que o espaço negativo e o positivo sejam apreciados – em contraste. São as sombras criadas por suas obras que revelam a conexão integral entre a escultura e o lugar que ela ocupa.
Gego continuamente discute os elementos estáveis e instáveis da arte: o objeto escultórico (estável) e suas sombras projetadas (instável).
No mesmo ano da morte da artista, sua família fundou a Fundação Gego para preservar seu legado artístico, promovendo a conscientização da significativa contribuição da artista para o mundo da arte venezuelana A Fundação Gego deu permissão para publicar os escritos e testemunhos pessoais de Gego em 2005. Esses escritos, agora publicados, podem influenciar outros artistas em seu modo inovador e experimental de pensar a escultura.
Panamá: Sandra Eleta – Artista e Fotógrafa, nasceu na Cidade do Panamá, em 1942. Nos anos de 1970, Eleta estudou Belas Artes no Finch College, Fotografia no International Center of Photography e Ciências Sociais na New School of Social Research, em Nova Iorque. No final da mesma década retornou ao Panamá, se fixando em Portobelo, onde vive e trabalha até hoje.
Seu estudo de Investigação Social a levou a contar as histórias de vida de várias pessoas em diferentes classes sociais na América Latina.
Ela é conhecida por uma fotografia que capturou em 1977 no Panamá, intitulada La del plumero.
La del plumero deu origem a uma série de fotografias que a artista nomeou Servidumbre. O conjunto de fotografias registra o cotidiano de mulheres serviçais. Através de imagens, a artista procurou descobrir as diferenças entre as gerações mais velhas e as mais novas relacionadas à servidão. A artista constatou que existe uma profunda relação entre essas mulheres e suas profissões.
Em depoimento dado durante a exposição Radical Women in Latin American Art, realizada em 2017, no Hammer Museum de Los Angeles (EUA), a artista nos diz: Ela é a personificação de sua arte. Para ela, não há divisão entre seu papel e seu ser. Não há questionamentos…a maior parte de sua vida foi passada dentro dos limites de uma residência familiar, que ela passou a considerar a sua própria, já que ela mal conhecia outra…
Outra importante série de fotografias é Portobelo. Sobre ela Eleta escreveu: Pode-se dizer que, com essa série, minha vida e a fotografia se tornaram uma. Quando chegou a Portobelo, no início dos anos 70, começou a fotografar a população local: aqueles que a envolviam de maneira profunda, que pareciam ressoar o que ela sentia mais profundamente dentro de si. Naturalmente, se aproximou das pessoas na esperança de compreender as profundezas de suas almas. Eleta entendeu que não poderia realizar isso sozinha. Conquistando confiança: eles se revelaram a mim de bom grado, permitindo que suas auras repousassem nas minhas lentes. Então, como um convite para dançar, nos encontramos presos em um ritmo mútuo, completamente livre, completamente sintonizado.
Pode-se dizer também que, com esta série, nasceu a própria identidade fotográfica de Eleta: ao me deparar com essas imagens pela primeira vez, senti que estava me olhando, mas de um ponto de vista renovado.
Cuba: Ana Mendieta – (1948 – 1985) foi uma artista multimidiática cubana, conhecida por suas obras de arte corpo-terra (earth-body). Nascida em Havana, Mendieta chegou aos Estados Unidos como refugiada em 1961, dois anos após o ditador Fidel Castro depor Fulgêncio Batista.
A artista nasceu em uma família de políticos proeminentes. Aos 12 anos de idade, a fim de escapar do regime de Fidel Castro, Ana e sua irmã foram enviadas aos Estados Unidos por seus pais para viverem em Iowa, fazendo parte de um programa patrocinado pelo governo acolher crianças cubanas, sob o regime de Castro.
Mendieta e sua irmã passaram suas primeiras semanas em campos de refugiados antes de passarem por várias instituições e em casas de famílias adotivas. Em 1966, Mendieta reencontrou sua mãe e seu irmão mais novo; seu pai se juntou a eles em 1979, depois de 18 anos em prisão política em Cuba.
Mendieta estudou Artes e Intermídia na Universidade de Iowa. Ao longo de sua carreira, criou obras em Cuba, México, Itália e nos Estados Unidos.
A Artista construiu uma obra autobiográfica e focada em temas que incluem feminismo, violência, vida, morte, lugar e pertencimento. Seus trabalhos, geralmente, estão associados aos quatro elementos da natureza.
Frequentemente buscava uma conexão física e espiritual com a Terra: Eu me torno uma extensão da natureza e a natureza se torna uma extensão do meu corpo. Este ato obsessivo de reafirmar meus laços com a terra é realmente uma reativação das minhas crenças primitivas.
Mendieta produziu mais de 200 obras usando a terra como meio artístico.
Uma de suas obras mais longevas é a Silueta Series, iniciada em1973, e que envolveu a criação de silhuetas femininas na natureza – em barro, areia e grama – com materiais naturais e sangue, criando marcas de corpos.
Em 1978, Ana Mendieta passou a integrar o Artists In Residence, em Nova Iorque – a primeira galeria para mulheres fundada nos Estados Unidos.
Após dois anos de seu envolvimento na A.I.R. ela concluiu que o Feminismo Americano é basicamente um movimento da classe média branca e buscou desafiar os limites dessa perspectiva através da sua arte.
A obra de Ana Mendieta é atualmente gerenciada pela Galerie Lelong, em Nova Iorque, e desde sua morte, a artista tem sido homenageada com retrospectivas internacionais.
Em 2004, o Hirshhorn Museum and Sculpture Garden em Washington, D.C., organizou a mostra itinerante Earth Body, Sculpture and Performance, uma grande retrospectiva da artista.
Sua morte, pode-se dizer, foi tão trágica quanto sua vida e arte: após cair do 34º andar do seu apartamento em Greenwich Village, onde vivia com o marido – o também artista Carl Andre. Ela caiu sobre o teto de uma loja. Vizinhos escutaram uma briga violenta entre o casal. Não houve nenhuma testemunha ocular. Numa gravação de uma chamada de Carl para o 911, ele diz: minha esposa é uma artista e eu sou um artista e nós tivemos uma discussão sobre o fato de que eu expus mais do que ela. Ela foi para o quarto e se jogou da janela.
México: Pia Camil – É uma artista nascida na Cidade do México em 1980. Sua obra compreende escultura, instalação, performance e arte têxtil, entre outras expressões.
Seu estilo evoca a paisagem urbana da Cidade de México, o modernismo, a publicidade e uma crítica aberta ao consumismo. Suas obras integram a participação das pessoas que, ao visitarem suas exposições, podem intervir na peças vestindo parte das obras.
Estudou na Rhode Island School of Design (EUA) e na Slade School of Fine Art (Londres).
Seu trabalho, ainda que percebida sua breve carreira artística, já foi exibido internacionalmente com exposições individuais recentes, incluindo: Here Comes The Sun, performance no Museu Guggenheim; sob o mote sente-se, relaxe, olhe, fale, role, toque, ouça, dê, leve, dance, compartilhe expôs no Queens Museum (2019) – os dois em Nova Iorque; Bara, Bara, Bara, Tramway Art Space, em Glasgow (2019).
Embora o trabalho de Camil esteja geralmente associado à paisagem urbana mexicana, à linguagem estética do modernismo e sua relação com o varejo e a publicidade, suas instalações alcançam um notável nível de universalidade. Cada vez mais ela reivindica a participação do público, de diferentes geografias e diversificadas culturas, em processos de engajamentos expressivos e tomada de consciência sobre a política do consumismo.
Conclusão
Ao pensar a América Latina, sociedades; a Arte Latino-Americana, seus artistas e ao esboçar uma cartografia do turbilhão cultural e do universo simbólico que envolve a história que foi sendo coletivamente construída; não se negligência as invasões, as resistências, as linguagens e as diferentes expressões humanas. Os apontamentos expostos, de forma análoga a um mapa-, o qual possui superfícies, texturas e se define por usas aproximações e distanciamentos territoriais, apresentam harmonias e contrastes, mas principalmente, revelam artistas e suas obras; conectam os corações ligados aos pulsos: em contínua tensão e processos.
Pela Arte, a periferia se torna centro! Pela arte, o centro se esgarça num infinito desenho não linear e revela-se ao mundo em sua vasta riqueza material dos povos autóctones, índios e negros e tantos outros, os quais reafirmam a identidade latino-americana.
São artistas que constroem discursos e narrativas: visuais, sonoras, gestuais, literárias – como não poderia deixar de ser, em múltiplas linguagens.
Ao descrever alguns artistas, tantos outros foram deixados de fora. Porém, o esforço foi evidenciar alguns blocos: no Cone Sul valorizou-se o Chile, com especial destaque para: Lotty Rosenfeld (1946-2020). Na Argentina, Marta Minujín (1943) e no Uruguai: Torres García (1874 – 1949). No Brasil, valorizou-se Beatriz Milhazes (1960). Ao destacar o Paraguai, comentou-se sobre a vida e obra de Ramón Cáceres (1944).
Os países Andinos foram representados pela arte da Bolívia com o artista Roberto Mamani Mamani (1962) e no Peru com o artista visual Fernando de Szyszlo (1925 – 2017). No Equador: Oswaldo Guayasamín (1919 – 1999) e na Colômbia: Doris Salcedo (1958).
O Círculo Caribenho foi representado pela Venezuela com a artista conhecida como Gego (1912 – 1994). Ao destacar o Panamá, valorizou-se a expressão artística de Sandra Eleta (1942) e, em Cuba, Ana Mendieta (1948 – 1985). O México, com Pia Camil (1980)
Recordar sobre os artistas e suas obras nos permitiu, num curto espaço e nesse breve resgate, sermos novamente seduzidos pela Arte latino americana e legitimar sua força comunicativa enquanto expressão e lugar no mundo.
Referências
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